Escuta ambiental feita com auxílio do MP deve ter autorização judicial
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STJ: Para Sexta Turma, escuta ambiental feita com auxílio do MP deve ter autorização judicial
A escuta ambiental feita por um dos interlocutores, com auxílio da polícia ou do Ministério Público (MP), precisa de autorização judicial para ser aceita como prova.
Para a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), essa autorização é indispensável para evitar que a cooperação com o órgão de persecução penal se torne abusiva, tendo em vista que, nessa circunstância, a atuação do particular o aproxima da figura do agente colaborador ou infiltrado.
Com base nesse entendimento, o colegiado reconheceu a ilicitude de uma investigação feita pelo Ministério Público de Goiás no âmbito da Operação Poltergeist.
Deflagrada em 2014, ela visava desarticular suposta organização criminosa envolvida em desvio de recursos públicos por meio da contratação de servidores “fantasmas” em gabinetes da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal de Goiânia.
Na origem da operação, uma das pessoas que teriam participado do esquema buscou o MP para relatar a irregularidade. Com equipamentos fornecidos pelos promotores, ela fez as gravações que embasaram a denúncia.
Ao negar o habeas corpus impetrado pela defesa de um dos investigados, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) entendeu que a interferência do MP não invalidou a prova, pois o registro foi feito de forma espontânea.
Além disso, a corte estadual considerou que não haveria exigência de autorização judicial para gravação ambiental.
Em recurso ao STJ, o investigado argumentou que os precedentes citados para justificar a legalidade da prova não se aplicam ao caso, pois tratam de captação ambiental feita pela vítima do crime ou por particular no exercício de autodefesa, com auxílio da polícia.
Escuta Ambiental na jurisprudência do STJ
Meios legais devem orientar produção de prova apoiada por órgão de persecução
O ministro Sebastião Reis Junior, cujo voto prevaleceu no julgamento, observou que a Lei 9.034/1995 – vigente à época dos fatos – exigia expressamente a autorização judicial para realização de captação ambiental, mas ela foi revogada pela Lei 12.850/2013.
Segundo o magistrado, ainda que o uso de gravação feita por um dos interlocutores sem a proteção legal do sigilo das informações seja admitido pela jurisprudência, esse procedimento deve ser visto com ressalvas quando apoiado por órgãos de persecução penal.
Nessas situações, Sebastião Reis Junior destacou que a produção da prova deve observar meios legais, como forma de contenção à atuação estatal e de atenção ao devido processo legal.
“Ao permitir a cooperação de órgão de persecução, a jurisprudência pode encorajar atuação abusiva, violadora de direitos e garantias do cidadão, até porque sempre vai pairar a dúvida se a iniciativa da gravação partiu da própria parte envolvida ou do órgão estatal envolvido”, alertou o ministro.
Para relator, limite de atuação estatal é demanda republicana e democrática
Sebastião Reis Junior enfatizou que o caso não trata de uma conversa privada em que um dos interlocutores, por conta própria, faz a gravação para eventual ação futura.
Para ele, a interferência do MP coloca a pessoa disposta a colher provas em condição próxima à de um agente colaborador ou infiltrado, sendo difícil supor que o órgão não forneça, por exemplo, orientações sobre como conduzir a conversa a fim de obter informações relevantes.
“É uma demanda republicana e democrática limitar essa atuação, submetendo-a ao crivo judicial. Não havia qualquer impeditivo para, à época, obtê-la”, salientou.
Ao dar provimento ao recurso em habeas corpus, o relator ainda afirmou que a preocupação com o tema é amparada por diversos casos do direito internacional, que abordam fundamentos compatíveis com as normas brasileiras.
“Considerando a efetiva e reconhecida participação do órgão de persecução estatal na obtenção da prova aqui questionada sem prévia autorização judicial, entendo como ilegal a gravação obtida e, por isso, deve ser excluída, bem como todas as provas derivadas”, concluiu o ministro.
Veja a Ementa:
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PECULATO. GRAVAÇÃO AMBIENTAL REALIZADA POR UM DOS INTERLOCUTORES SOB A ÉGIDE DA LEI N. 9.034/95 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 10.217/2001). PARTICIPAÇÃO DO ÓRGÃO ACUSADOR. FORNECIMENTO DE APARATO DE GRAVAÇÃO. ILICITUDE DA PROVA. SUPERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR.
A gravação realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, não protegida por um sigilo legal (QO no Inq. n. 2116, Supremo Tribunal Federal) é prova válida. Trata-se de hipótese pacífica na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, pois se considera que os interlocutores podem, em depoimento pessoal ou em testemunho, revelar o teor dos diálogos.
A produção da prova obtida com colaboração de órgão estatal deve observar as fórmulas legais, tendo em conta a contenção da atuação estatal, cingindo-o, por princípio, às fórmulas do devido processo legal. Ao permitir a cooperação de órgão de persecução, a jurisprudência pode encorajar atuação abusiva, violadora de direitos e garantias do cidadão, até porque sempre vai pairar a dúvida se a iniciativa da gravação partiu da própria parte envolvida ou do órgão estatal envolvido.
A participação do Ministério Público na produção da prova, fornecendo equipamento, aproxima o agente particular de um agente colaborador ou de um agente infiltrado e, consequentemente, de suas restrições.
A participação da polícia ou do Ministério Público na produção da prova exerce a atração dos marcos legais, que, no caso, exigiam, repito, “circunstanciada autorização judicial”. Não obtida a chancela do Poder Judiciário, opera a regra de exclusão, pois a prova em questão é ilícita.
Agravo regimental provido”.
(STJ, AgRg no RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 150.343 – GO, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Rel. p/ acórdão Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, j. 15/08/2023).
Fonte: Superior Tribunal de Justiça – Notícias
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